Foi em janeiro de 2009 que eu ouvi falar pela primeira vez de Jon Jones. Foi quando fazia a minha pesquisa de rotina para comentar o UFC 94, com a revanche entre GSP e BJ Penn como luta principal.
Meu ritual de preparação para as transmissões do UFC consiste em estudo das lutas anteriores, do passado dos lutadores e como foi a preparação específica para a próxima luta. Quando falamos de atletas brasileiros, além de ver as lutas sempre rola aquele telefonema para treinadores, atletas da mesma equipe e pessoas próximas para saber como vão os treinos, além de muitas vezes ir à própria academia para ver de perto e sentir e clima. Com os estrangeiros, se são veteranos conhecidos como GSP e BJ, o trabalho também é mais fácil porque você já viu a maioria das lutas, conhece mais sobre a história de cada um e sua preparação tem amplia divulgação na imprensa.
O mais difícil é quando você se vê diante de um estrangeiro jovem e desconhecido. Muitas vezes você não encontra suas lutas, informações sobre sua vida, com quem treina, etc e tal. Ou seja, um pesadelo para um maníaco compulsivo como eu, que se não tem tudo preparado perfeitamente na antevéspera começa a suar frio.
E foi exatamente o que aconteceu com Jon Jones naquela ocasião. Ele ia lutar contra Stephen Bonnar e eu não conseguia encontrar absolutamente nada além do fato dele ter aceitado lutar contra André Gusmão com apenas três semanas de antecedência e ter dominado o brasileiro com um estilo de jogo muito solto, explosivo e diferente. Relendo minhas observações hoje, vejo que tinha anotado: “Treina MMA há apenas 1 ano e 2 meses”; “Todas as (7 primeiras) lutas foram em 2008”; “Muito rápido, criativo e boas quedas. Mas muito cru!”; “Academia: Team BombSquad (???)”. Muito pouco para fazer uma boa transmissão.
Foi quando eu resolvi ligar para um colega jornalista americano que estava em Las Vegas para cobrir as lutas. E a primeira coisa que o sujeito falou chamou muito minha atenção: Jon Jones, esse moleque de 21 anos, tinha pedido para a organização do UFC para não ficar no hotel oficial do evento para evitar a badalação. Que era um garoto muito humilde e talentoso, que vinha de uma família de atletas (dois de seus irmãos jogam futebol americano).
E naquela noite os fãs de luta foram apresentados a um dos maiores talentos que surgiu nos últimos anos, com um show de golpes giratórios, quedas fantásticas e uma criatividade fascinante que beirava o irresponsável, tamanha a liberdade e soltura juvenil mostrada no octagon. Lembro que eu e meu amigo e colega de transmissão, Carlão Barreto, ficamos alucinados com aquele moleque.
E desde então é show atrás de show. Ele deixou o pequeno time perto de casa, na região de Nova York, e foi recrutado pelo badalado técnico das ‘estrelas’ Greg Jackson. Cresceu como atleta, deixou de ser cru mas não deixou de ser criativo, vencendo atletas duros como Brandon Vera, Ryan Bader e Vladimir Matyushenko com enorme facilidade. Mas, acima de tudo, não deixou de ser humilde e boa praça!
Conheci Jon Jones pessoalmente há seis semanas em Las Vegas e a impressão que era passada pelas entrevistas e por outras pessoas apenas se confirmou. O Jon Jones que conheci é uma figura encantadora. Simpático, carismático, divertido, super acessível e humilde. “Parece da galera”, como bem definiu um colega jornalista lá nos bastidores do UFC 126.
Por isso é tão esquisito acompanhar aqui de longe essa mudança de postura radical do americano nos dias que antecedem sua luta contra Mauricio Shogun.
Beira o desrespeito as declarações no ‘Countdown’ dizendo que já está assinando autógrafos como “Jon Jones Campeão” e que é algo que ele já vê natural. Falando em terceira pessoa como os piores exemplos de boleiros e soltando ‘pérolas’ como “chegou o momento da ascensão de Jon Jones ao estrelato”.
Como fã de MMA, eu vejo tudo isso com uma certa tristeza, porque são raras as vezes que vemos um atleta jovem e brilhante ter uma atitude humilde e madura diante da fama. E por mais de dois anos Jon Jones criou essa expectativa em muita gente, criou uma legião de fãs e admiradores não só de seu talento dentro do octagon como de sua postura, personalidade e carisma fora dele. Será que alguém pode mudar tanto assim em apenas seis semanas? Será uma estratégia de marketing para promover a luta? Será um sinal da imaturidade e inexperiência? Um sinal de excesso de confiança pelo ‘oba-oba’ criado pela imprensa americana? Ou de medo e insegurança?
Seja o motivo que for, o ‘estrago’ já está feito. Jon Jones foi vaiado por fãs durante a coletiva de imprensa da última quarta-feira e pelos blogs e twitters se espalha como um vírus o sentimento de rejeição a esse ‘novo’ Jon Jones e sua postura arrogante.
Como brasileiro e fã incondicional de Shogun, eu não precisava de motivos para torcer por meu conterrâneo curitibano. Mas sabe quando você não quer apenas que seu lutador favorito ganhe, mas que o ‘marrento’ perca feio? Pois é... Estou vendo esse sentimento surgir, ainda que um pouco tímido e melancólico, querendo acreditar que aquele cara gente boa ainda existe ali em algum lugar.
Fica essa esperança de que, independente do resultado de sábado, ganhando ou perdendo, Jon Jones reveja os seus valores e prioridades, repense no caminho que quer tomar na sua carreira, e volte a ser aquele garoto simpático, humilde e amável. De preferência, com uma derrota, para que aprenda a respeitar aqueles que vieram antes dele e pavimentaram com sangue, suor e lágrimas durante anos essa estrada onde agora ele pode dirigir um carrão! Ele tem uma brilhante carreira pela frente e deveria se espelhar em outros jovens campeões que tem atitudes exemplares, como José Aldo e Cain Velasquez. O caminho da arte marcial é baseado no respeito e num esporte tão surpreendente imprevisível como o MMA, se você não aprender isso na academia, alguém um dia pode te ensinar de forma muito mais dolorosa dentro da arena octogonal.