terça-feira, 15 de agosto de 2006

Eu ia escrever um texto sobre o que viria após o cessar fogo, mas após ler o texto do meu colega Robert Fisk, resolvi traduzí-lo e colocá-lo aqui, pq melhores palavras que as dele nao há.

E com o cessar fogo... começa a guerra de verdade

Por Robert Fisk, correspondente do The Independent em Beirut

A verdadeira guerra no Líbano começa hj. O mundo pode acreditar - e Israel tbm - que com o cessar fogo imposto pela ONU vai chegar ao fim essa guerra suja que já matou mais de mil civis libaneses e 30 civis israelenses. Mas a realidade é bem diferente e nao será vítima dessa ilusao: o exército de Israel, acoado pelo Hezbollah nas últimas 24h, agora encara uma das mais difíceis guerras de guerrilha já travadas em sua história. E essa eles correm inclusive o risco de perder.

No todo, pelo menos 39 - possivelmente 43 - soldados israelenses foram mortos no último dia enquanto as guerrilhas do Hezbollah, que continuam lançando foguetes contra Israel, lutam contra a invasao massiça de Israel ao Líbano.

As autoridades israelenses falaram em "limpar" e "varrer" suas tropas do sul do Líbano, mas para os libaneses, a sensaçao que se tem é que o Hezbollah que está fazendo a "limpeza". Até a noite de ontem, o exercito isralense nao foi nem capaz de alcançar a tripulaçao morta do seu helicóptero - abatido na noite de sábado - que caiu num vale Libanes.

Oficialmente, Israel aceitou o cessar fogo da ONU que acaba com a ofensiva militar israelense e com os ataques do Hezbollah, e o Hezbollah declarou que estará com o cessar fogo, enquanto nao exista nenhuma tropa israelense no sul do Líbano. Mas 10 mil soldados israelenses estao dentro do país e agora sao 10 mil alvos para o Hezbollah.

Desde a manha de hj, operaçoes do Hezbollah serao apenas e diretamente contra a força de invasao. E Israel nao pode se dar ao luxo de perder 40 homens em apenas um dia. Incapaz de abater os caças F-16 israelenses que traformaram grande parte do Líbano em escombros, eles rezaram e desejaram e esperaram pelo momento em que eles poderiam atacar as forças de Israel no sólo.

Agora o Hezbollah está pronto para finalmente colocar sua tao planejada campanha militar em açao. Milhares de seus guerrilheiros estao vivos, armados e preparados para as operaçoes dentro dos vilarejos e cidade em ruínas do sul do Líbano, esperando apenas por este momento. Apenas horas depois de seu líder, Said Hassan Nasrallah, avisar Israel que seus homens estariam esperando por eles em suas trincheras no rio Litani, o Hezbollah armou sua armadilha e matou mais de 20 soldados israelenses em menos de 3 horas.

Israel mesmo, segundo relatórios de Washington e Nova Iorque, planejou durante muito tempo a atual operaçao no Líbano, mas Israel parece nao ter levado em conta o mais óbvio plano de operaçao da guerrilha xiita: que se eles conseguissem agüentar os dias de ataque aéreo, conseguiriam forçar Israel a reocupar o sul do Líbano por terra e assim, lutar de igual para igual.

Os misseis guiados a laser do Hezbollah - de fabricaçao iraniana, assim como as armas israelenses feitas nos EUA - parecem ter trazido o caos às tropas israelenses no sábado, além do abate contra o helicóptero de combate, um feito sem precedentes na sua luta contra Israel.

Em teoria, comboios de ajuda humanitária terao acesso ao sul do país onde milhares de xiitas libaneses estao presos em seus vilarejos, mas ninguém sabe se o Hezbollah vai esperar alguns dias - eles, assim como os israelenses, estao fisicamente cansados - para permitir que a ajuda chegue às cidades destruídas.

E as atrocidades continuam por todo Líbano, sendo a mais recente um ataque a um comboio de carros levando 600 famílias cristas desde a cidade de Marjayoun. Mesmo sendo escoltados por soldados Libaneses e por membros da ONU, foram atacados por um caça israelense. Pelo menos 7 morreram, incluindo a mulher do prefeito, uma senhora crita decapitada pelo míssel que atingiu seu carro.

No leste de Beirute ontem, um caça israelense destruiu um prédio de oito andares onde viviam 6 famílias. Além deles, mais 12 pessoas morreram no sul do Líbano, incluindo uma mae, seu filho e a babá.

Um israelense foi morto por um Katiucha lançado pelo Hezbollah sobre a fronteira. O exército da guerrilha - "terroristas" para Israel e os EUA mas heróis para o mundo islâmico - têm muitas mortes para vingar, apesar de que sua liderança está menos interessada no olho por olho e totalmente focada e faminta por atacar o exército israelense.

Nessa conjuntura mortal dentro da história do Oriente Médio - e ninguém deve subestimar a importancia desse momento para a regiao - o exercito de Israel parece tao impotente no dever de proteger seu país quanto o Hezbollah é de proteger o Líbano.

Mas se o cessar fogo falhar, como parece que vai, nem Israel nem os americanos parecem ter qualquer plano para escapar das consequencias. Os EUA viram nessa guerra uma oportunidade de estremecer Síria e Iran - os patrocinadores do Hezbollah - mas parece que o que está havendo é uma virada de mesa. Já o exército israelense para muito eficiente em distruir pontes, estaçoes de energia, prédios e postos de gasolina, mas totalmente incapaz de atingir o exército dos "terroristas" que eles eles juraram liquidar.

"O governo libanes será o responsável por qualquer violaçao do cessar fogo" disse o primeiro ministro de Israel, Ehud Olmert, como se já soubesse que a trégua nao vai durar.

E isso, é claro, dá a Israel mais uma desculpa para atacar infraestrutura civil libanesa.

Muito mais preocupante, no entanto, sao os termos vagos da resoluçao do conselho de segurança da ONU sobre a força internacional que deveria ocupar o sul do Líbano.

Se Israel e Hezbollah comecem novamente a guerra no sul durante as próximas semana, que país se atreverá mandar suas tropas à essa selva que o sul do Líbano se transformará?

É trágico - e fatal para os involvidos - que a verdadeira guerra no Líbano começa hoje.

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