sábado, 12 de janeiro de 2013

Green Bay Packers e o pesadelo de um fã do 49ers

O que seria do esporte sem uma boa rivalidade?

Fla x Flu, Corinthians x Palmeiras, River x Boca, Real x Barça, Borg x McEnroe, Celtics x Lakers, Frazier x Ali, Yankees x Red Sox...

A rivalidade inflama as torcidas, infla os noticiários e é a maior amiga da audiência. Mas quando o rival se torna uma espécie de algoz, ele vira um pesadelo na vida de qualquer torcedor apaixonado. É só perguntar pra qualquer vascaíno quando encara um flamenguista.

Uma rivalidade parecida a que existe entre o San Francisco 49ers e o Green Bay Packers, criada nos anos 90.

Packers e Niners são dois dos times mais tradicionais da NFL. Juntos, eles somam 20% dos títulos do Super Bowl (9 de 46). O time de Wisconsin é o terceiro no ranking de vitórias nos playoffs (30), seguido do time do norte da Califórnia, com 26. E muita dessa história dos dois times na fase decisiva da NFL foi compartilhada, com amplia vantagem para o Packers.

Entre 1996 e 2002, os times se enfrentaram 5 vezes nos Playoffs, com 4 vitórias do Packers. Vitórias essas que representaram o fim de uma dinastia de cinco Super Bowls vencidos pelo 49ers entre 1982 e 1995 e o começo de um jejum de títulos que já dura quase 20 anos. Por outro lado, o confronto marca o início de uma fase vitoriosa do Green Bay, que conquistou 1 Super Bowl comandado pelo quarterback Brett Favre. Memórias gloriosas de um lado, ressaca e dor de cabeça do outro.

O primeiro dos confrontos foi uma grande surpresa. O 49ers jogava em casa e era o atual campeão da NFL, com uma equipe estrelar e consagrada encabeçada por Steve Young e Jerry Rice. Mas foi o o azarão que levou a melhor graças a uma atuação de gala do jovem Favre, que teve apenas 7 passes incompletos na ocasião. No ano seguinte, o trauma aumentava. No gélido estádio do Packers, o histórico Lambeau Field, o jogo teve até o folclórico dono do 49ers, Eddie DeBartolo, caindo no tapa com torcedores do Green Bay. Foi uma lavada. 21 a 0 só no primeiro tempo. O que custou o cargo do técnico do San Francisco, George Seifert, mesmo com um histórico irretocável de 98 vitórias, apenas 30 derrotas e 2 Super Bowls. Em 1998, a mesma história. E mesmo conseguindo vencer em 1999, o 49ers caiu diante do Falcons na semana seguinte e seguiu o jejum de Super Bowls.

A marca da decadência do 49ers começou com a saída de DeBartolo, que em 2000 foi obrigado a vender o time para a sua irmã e seu cunhado, Denise e John York devido ao seu envolvimento num escândalo de corrupção com o governo de Louisiana. Sem 1/10 da paixão e envolvimento de DeBartolo, os York foram aos poucos abandonando a instituição e a casa caiu depois de mais uma derrota para o Packer, nos Playoffs de 2002. Foi o início de um período de 10 anos de mediocridade, sem ir aos playoffs.

O Packers seguiu vencendo com Brett Favre e soube substituí-lo com outro quarterback genial, o californiano Aaron Rodgers, responsável pela conquista do Super Bowl de 2010.

Rodgers é hoje um dos melhores QBs da liga. Coincidência ou não, ele nasceu na região de San Francisco e cresceu fã do 49ers. Foi destaque da University of California, em Berkeley, a meia hora do estádio do 49ers. E no dia do draft universitário, ele foi esnobado pelo 49ers, que escolheu Alex Smith em vez dele. Smith teve os primeiros 6 anos da carreira horríveis, virou tema de piada e motivo de ódio dos fãs de San Francisco, sentimento que piorava quando se via Rodgers brilhar com o verde e amarelo, as cores do Green Bay. E Rodgers nunca escondeu de ninguém a raiva e frustração de ter sido literalmente esnobado pelo seu time do coração.


Enquanto Rodgers brilhava, o 49ers vivia no ostracismo. Período que acabou no ano passado graças a uma mudança de filosofia esportiva e administrativa liderada pelo filho dos York, Jed. O jovem, que cresceu ao lado do tio acompanhando de perto sua paixão pelo vermelho e dourado, pediu para assumir a administração do time em 2008. Aconselhado por DeBartolo e pela família Craft, donos do New England Patriots, Jed passou a recrutar uma equipe técnica e executiva de alto nível e a tratar o 49ers como uma empresa.

Em San Francisco, o projeto de Jed York demorou 3 anos para dar frutos, mas o resultado é, no mínimo, promissor. Hoje o 49ers tem reconhecidamente uma das melhores equipes econômicas e de olheiros da NFL. Jed trouxe Paraag Marathe e Gideon Yu, gênios do mercado financeiro e tecnológico, formados em Harvard e Stanford, para cuidar da parte administrativa e deixou a parte esportiva nas mãos de Trent Baalke, pupilo do lendário Dick Haley. Haley foi o responsável por montar o time histórico do Pittsburg Steelers dos anos 70 e foi mentor de Baalke no New York Jets. E o grande trunfo de Baalke, além de recrutar uma das melhores defesas da NFL, foi contratar o treinador Jim Harbaugh.

O folclore em torno de Harbaugh, ex-quarterback do Indianapolis Colts e Chicago Bears e filho de um técnico veterano, vale um texto inteiro. Ele transformou Alex Smith em um bom quarterback, fez a defesa montada por Baalke a melhor da NFL e, baseado num conhecimento tático e técnico fora de série, levou o 49ers ao topo da NFL quase que instantaneamente.

Ano passado o 49ers voltou aos Playoffs e esteve a um passo do Super Bowl, perdendo a 'semifinal' na prorrogação num erro de um jovem jogador. Um ano depois, o time é praticamente o mesmo, com uma diferença que pode ser o triunfo ou a desgraça de Harbaugh na noite de hoje, o jovem quarterback Colin Kaepernick. Após uma lesão, Harbaugh subtituiu o veterano Alex Smith por Kaepernick, mesmo com o titular jogando em alto nível.

O motivo: Smith é um jogador conservador e limitado fisicamente, que prefere não correr riscos e jogar de forma mais conservadora. Com a defesa do 49ers, seu estilo de jogo é eficiente enquanto o time não esteja em grande desvantagem. Mas Harbaug, um ex-quarterback muito parecido a Smith, parece saber que na NFL hoje em dia, com quartebacks como Rodgers geniais comandando ataques espetaculares, mesmo tendo uma excelente defesa, um time precisa ter um ataque capaz de manter o mesmo nível.

E aí entra Kaepernick, um atleta na concepção da palavra, ex-arremessador de beisebol famoso por lançar bolas a mais de 100km/h. Kaepernick é o anti-Alex Smith. Seus passes lembram aos do próprio Brett Favre, famoso pela violência com que lançava seus petardos. Kaepernick deslocou dedos de 3 jogadores essa temporada, incluindo do veterano Randy Moss, um dos maiores receivers de todos os tempos. E, além disso, com uma envergadura que lembra Usain Bolt, tem a capacidade de colocar a bola em baixo do braço e correr como um raio. Ele assume mais riscos, é jovem e coloca o time em situações de maior risco que Smith. Mas, por outro lado, seu talento é capaz de jogadas que Smith nunca sonhou.

Kaepernick comandou o 49ers em vitórias marcantes contra o New Orleans Saints e New England Patriots, fora de casa. O Patriots não perdia em casa na segunda metade da temporada desde 2009. E, em um momento, Colin abriu uma liderança de 28 pontos. O 49ers terminou a temporada em 2º na Conferência Nacional, seguido do Packers, em 3º.

Kaepernick x Rodgers tem tudo para honrar a tradição do confronto que foi marcado por duas lendas como Brett Favre e Steve Young. E o 'desejo de vingança' de Rodgers só faz aumentar a expectativa para o jogo de hoje a noite. Se você é fã da NFL, esse é o tipo de confronto que se espera o ano todo. E se vc não acompanha a NFL mas é fã de esportes, Packers x 49ers é uma bela ocasião para começar a assistir.

Hoje, as 23h de Brasília, no estádio de Candlestick em San Francisco: Green Bay Packers x San Francisco 49ers.

NFL como a NFL deve ser! :)

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