Eu penso em sexo o dia todo! E não adianta fazer cara de assustado ou me reprimir, pois você provavelmente é como eu. Praticamente todas nossas atitudes ou decisões, se não são tomadas visando o coito em si, o são feitas sempre pensando no sexo oposto (ou no mesmo sexo, vá lá! Têm gosto prá tudo). Sexo é bom demais e é vital para qualquer ser humano. Eu só não curto muito a maneira com que ele é tratado nos dias de hoje.
Prá expressar melhor o meu pensamento, faço minhas as palavras de Arnaldo Jabor, que em sua coluna dessa semana, mostrou ter a mesma opinião do que eu. E como a retórica dele é infinitamente superior à minha, seguem abaixo algumas de suas palavras.
O sexo já foi um comício e hoje é um mercado
Arnaldo Jabor
Eu só penso em sexo. Você também, recatado leitor. Todos os nossos sentimentos estão sendo canalizados para um mesmo buraco. Nunca vi a mídia tão sexualizada como hoje em dia. Ando pela rua e todos os outdoors são de mulher nua — outro dia, quase bati o carro na Marginal Pinheiros, por causa da lourinha nua da “Playboy”. Todas as capas de revista, tudo, é uma grande feira de mulher gostosa e homens raspadinhos. Tudo parece liberdade, mas a coisa é outra.
Esse programa do SBT, por exemplo, “Casa dos artistas”, joga com uma aparente liberdade, mas trabalha com um voyeurismo baixo nível, com o público apenas querendo ver “quem come quem”. O desejo do público é ver pelo “buraco da fechadura” a pretensa “descontração” dos “artistas”, pois para a população de pobres trabalhadores, artista ainda é sinônimo de prostituta ou malandro, como para Silvio Santos, como no século XIX. Por que não mostram a casa das elites? Ou a casa do próprio Silvio? Não. Ali, não. Ali moram as famílias, a base social da revista “Caras”, longe dos “sem-vergonhas” de sunga. Nunca vi tanta propaganda na mídia do sexo de consumo, a azaração e o sexo quantitativo te levando a comprar um sabonete ou a beber uma cerveja. A propaganda nos promete uma suruba transcendental. Todos queremos ir. Mas onde é?
Diante desta orgia pública dos milhares de corpos malhados de moças pobres e esperançosas, nos sentimos mal comidos, insatisfeitos, certos de que há uma casta de artistas de TV e playboys que se dão melhor que nós. Todos somos otários diante deste harém movente de apresentadoras, modelos, malandros e heróis sem camisa.
Antigamente, ou seja, nos anos 60 (oh... os recentes anos remotos) o sexo era uma novidade política, depois dos caretíssimos anos 50, quando até a gravidez era uma espécie de doença venérea, como disse o Rubem Braga. O sexo tinha algo de crime, algo de secreto, o pecado perfumava nossas vidas com o estímulo da culpa. Não havia motéis, nem pílula que, depois, fizeram mais pela liberdade sexual que mil livros feministas... Nos anos 60 todas as sacanagens foram testadas, mas chegou-se ao outro lado com uma vaga insatisfação. O que faltava? Faltava o pecado.
Com a re-caretização do mundo nos anos 70 (o mundo gira com movimentos de vai-e-vem, como uma cópula) a liberdade aparente conquistada andou para trás. Os sonhos viraram produto. Criou-se um mercado da liberdade. Todas as conquistas dos anos 60 viraram fetiches de consumo: revolta, igualdade, utopias, até o desespero e a angústia passaram a vender roupas e costumes. Sem o pecado ficamos insuportavelmente livres.
A partir dessa época até hoje, sob a aparência de grandes euforias narcisistas, de gestos e risos de prazer, há uma volta à caretice; no mundo de bundas e coxas lipoaspiradas, seios siliconados, bofes comedores, existe um regressismo oculto. O sexo, que prometia ser a democratização do corpo para todos (ohh utopias...) voltou a ter uma clara configuração “de classe”. A anatomia virou uma das poucas portas de fuga da classe baixa. Com a democratização e a sociedade de massas, o sonho pequeno burguês de um orgasmo utópico foi apropriado pelos excluídos como uma saída para a miséria. Nuas, todas as mulheres são iguais; a democracia da bunda. Lembram-se da menina mendiga que tentaram transformar em modelo ou da moça do MST que foi para a “Playboy”? A bunda é a esperança de milhões de Cinderelas...
A mídia e a propaganda compraram a liberdade, que não é mais “uma calça velha desbotada”, mas é a superação do pudor, da intimidade. Se alguma mulher ficar famosa, tem de tirar a roupa. O strip-tease é a anti-burka, mas, no fundo, meio igual. A pessoa não tem mais um corpo; o corpo é que tem uma pessoa, frágil, tênue, morando dentro dele. De dentro dos maiores “aviões” de bumbum exposto, de seios balouçantes, de coxas frementes e atemorizantes, sai uma vozinha romântica, desejando amor e filhos, pureza e lar. O corpo e a pessoa são duas coisas diferentes; a menina mostra sua bunda como se fosse uma irmã siamesa. Tanta oferta sexual me angustia, me dá a certeza de que meu desejo é programado por outros, por indústrias masturbatórias, me provocando tesão para me vender satisfação. ...
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